E a Vida Continua

Assistência Social e Espiritismo


Assistência Social e Espiritismo

Sérgio Biagi Gregório
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Conceito. 3. Histórico. 4. Assistência Social no Centro Espírita Ismael: 4.1. Posição da Assistência Social no Organograma do Centro Espírita Ismael; 4.2. Funcionamento de um Dia de Trabalho4.3. Financiamento do Trabalho Assistencial5. Ação Social Espírita: 5.1. Pública e Privada; 5.2 Missão do Espiritismo; 5.3. Não Confundir os Meios com os Fins; 6. Subsídios para Alicerçar a Ação Social Espírita. 7. Conclusão. 8. Bibliografia Consultada.
1. INTRODUÇÃO
O objetivo deste estudo é refletir sobre a ação social. Sendo assim, a nossa peça oratória comportará uma visão histórica do termo, a estruturação da Assistência Social no Centro Espírita Ismael e os subsídios que a Doutrina Espírita nos oferece para praticá-la a contento.
2. CONCEITO
Assistência – do lat. Assistentia. Ato ou efeito de assistir a alguma coisa.
Assistência Social – Conjunto de medidas – reforço alimentar, creche, serviços de saúde etc – através das quais o Estado procura atender a certas necessidades das pessoas que normalmente não dispõem de meios para fazer frente a elas, ainda que em nível mínimo. (Dicionário de Ciências Sociais)
Voluntário – Segundo definição das Nações Unidas, “o voluntário é o jovem ou o adulto que, devido a seu interesse pessoal e ao seu espírito cívico, dedica parte de seu tempo, sem remuneração alguma, a diversas formas de atividades, organizadas ou não, de bem-estar social, ou outros campos...”
3. HISTÓRICO
O fato de na antiguidade não haver asilos nem orfanatos como os encontramos hoje, não é motivo para afirmarmos que a Assistência Social não existia. Registros históricos mostram que os Egípcios – 5000 anos a.C. – respeitavam o próximo e reverenciavam os mortos, os Babilônios – 3000 anos a.C. – dispensavam consolo aos aflitos e não separavam os casais de escravos, os Hindus (na pessoa de Buda) – 600 anos a.C. – ensinavam por parábolas a tolerância, a igualdade e a bondade e os Chineses (pela influência de Confúcio) – 600 anos a.C. – ensinavam a bondade e a lealdade, a fim de se alcançar um ideal superior.
Afigura-se que somente depois da aceitação do Cristianismo como religião legal é que os povos do passado trataram de organizar instituições de assistência com caráter oficial e permanente. Com Jesus Cristo a assistência resplandece em cada ato, como está gravado nas páginas do Evangelho, abrangendo o tríplice sentido de universalidade: 1) alcança a todos os homens: escravos, inimigos e perseguidos; 2) estende-se além do campo material, atendendo também às necessidades morais e espirituais, visando ao mesmo tempo o corpo e a alma; 3) penetra todas as instituições, dilatando o conceito de justiça e de fraternidade.
O Evangelho de Jesus dá a base para a verdadeira caridade e amplia o conceito de amor ao próximo, conforme se depreende dos ensinos: O Bom Samaritano (Lucas X: 25-37); “Tudo o que quereis que os homens vos façam, fazei também a eles...” (Mateus VII:12); “Tratai todos os homens como quereríeis que eles vos tratassem.” (Lucas VI:31); O que é necessário para salvar-se (Mateus XXV:31-46); O amor aos inimigos (Mateus V:43-47; Lucas VI:32-36).
Com o surgimento da Revolução Industrial (séc. XVIII), o Capitalismo (séc. XIX) e os avanços da globalização na época atual, em que muitos empregos e ocupações foram se extinguindo, o desemprego passou a imperar e com ele a necessidade daqueles que têm mais auxiliar os que têm menos.
O Espiritismo, com Allan Kardec, traz nova luz à tarefa assistencial, realçando a responsabilidade de seus seguidores pelo preceito “Fora da Caridade não há Salvação”
A primeira campanha promovida por entidade espírita de que se tem notícia foi realizada por Kardec através da Revista Espírita (janeiro de 1863) com o objetivo de arrecadar recursos para socorrer os operários de Rouen, França, vitimados por rigoroso inverno. Graças às doações recebidas foi possível levar alguma tranqüilidade a inúmeras famílias em provação.
No Brasil, muitos foram os espíritas cuja dedicação e amor, no campo assistencial, se transformaram em exemplo. Entre eles, destacam-se Bezerra de Menezes, Eurípedes Barsanulfo, Anália Franco e Batuíra.
Adolfo Bezerra de Menezes (1831-1900) – apóstolo do Espiritismo. Como médico, dedicou-se, com grande desapego e amor, à assistência aos doentes e a todos que o procuravam necessitados de auxílio.
Eurípedes Barsanulfo (1880-1918), natural de Sacramento-MG, educador, espírita, dotado de diversas faculdades mediúnicas, dedicou sua vida à educação do jovem, aos aflitos e abandonados pela sorte. Atendia a todos que o procuravam e ainda, em momentos de folga, saía pelos arrabaldes da cidade a socorrer doentes, assistindo os necessitados de toda ordem e pregando a doutrina do amor ao próximo.
Anália Franco (1856-1919), emérita educadora, se entregava, de corpo e alma, à prática do bem. Fundou e supervisionou mais de 70 asilos, creches e escolas espalhadas por vários Estados brasileiros. A síntese do seu pensamento era: “O nosso fim é procurar diminuir cada vez mais em nosso meio a necessidade da esmola pelo desenvolvimento da educação e do trabalho, de que provém o bem-estar e a moralidade das classes pobres. Eduquemos e amparemos as pobres crianças que necessitam de nosso auxílio, arrancando-as das trilhas dos vícios, tornando-as cidadãos úteis e dignos para o engrandecimento de nossa pátria.”
Antonio Gonçalves da Silva – “Batuíra” (...- 1909), português, veio para o Brasil ainda criança e, como imigrante, aqui cresceu e desenvolveu sua obra de dedicação ao próximo. Em 1873, por ocasião da epidemia de varíola, assistiu aos doentes e flagelados com verdadeiro espírito de renúncia, dando não apenas o remédio, mas também o pão, o teto e o agasalho. (Manual de Apoio da FEB)
4. ASSISTÊNCIA SOCIAL NO CENTRO ESPÍRITA ISMAEL
4.1. POSIÇÃO DA ASSISTÊNCIA SOCIAL NO ORGANOGRAMA DO CENTRO ESPÍRITA ISMAEL
organograma é o quadro geométrico representativo das unidades de uma organização ou serviço e indica os limites das atribuições de cada uma delas. Assim, no topo do quadro está a Diretoria Executiva, em seguida os Departamentos e abaixo destes, os Sub-Departamentos.
O topo do organograma do Centro Espírita Ismael pode ser visualizado abaixo:
Diretoria Executiva



DEPCOM
DEPIJM
DEPAE
DEPAS
DEPOE
DEPED
DEPEV

DEPCOM - Departamento Comercial
DEPIJM - Departamento de Infância, Juventude e Mocidade
DEPAE - Departamento de Assistência Espiritual
DEPAS - Departamento de Assistência Social
DEPOE - Departamento de Orientação e Encaminhamento (Entrevista)
DEPED - Departamento de Ensino Doutrinário
DEPEV - Departamento de Eventos

O organograma do  Departamento de Assistência Social do Centro Espírita Ismael pode ser visualizado abaixo:

Departamento de Assistência Social



Gestantes
Famílias
Orientação
 Profissional
Costura

1) Gestantes – Setor em que se compõe o enxoval, que será distribuído  às gestantes carentes, depois de terem freqüentado 12 reuniões. Um enxoval é constituído de mijãozinho, meias, blusa, chupeta...
2) Famílias (alimento) – As gestantes cadastradas (aproximadamente 80 famílias) recebem cestas básicas – compostas de arroz, feijão, óleo, açúcar, sal etc. – por um período de 3 a 4 meses.

3) Orientação Profissional – Com aulas de pintura em tecido, tricô, crochê, bordados, a Assistência Social do C. E. I. procura incentivar o trabalho, inclusive como alternativa de renda, pela venda das peças produzidas.
4) Setor de Costura – Confeccionam-se roupas para: 1) composição das peças do enxoval; 2) serem vendidas no BAZAR permanente.
4.2. FUNCIONAMENTO DE UM DIA DE TRABALHO
1) Todas as gestantes participam de um trabalho de Assistência Espiritual, recebendo orientações para a vivência cristã e passes espirituais.
2) Enquanto as gestantes ouvem as palestras, seus filhos participam da evangelização infantil, com os respectivos passes espirituais. Além disso, tomam lanche, suco e periodicamente ganham brinquedos usados. No início do ano letivo, o Centro Espírita Ismael auxilia com doação de material escolar.
3) Após a reunião é facultativo às gestantes e freqüentadoras carentes terem aula de pintura em tecido, tricô, crochê, bordados, com alternativa de geração de renda.

4) Ao término das reuniões, as gestantes tomam lanche e suco.

5) Periodicamente recebem a visita de um Psicólogo ou Assistente Social, os quais ministram aulas sobre saúde, higiene, prevenção de doenças venéreas e AIDS.

6) Há sorteios variados e, duas vezes por mês, faz-se uma "feirinha", em que escolhem as roupas que foram doadas. O restante dessas roupas é enviado à Casa de David.

7) Distribuem-se cestas básicas e enxoval, conforme programação.  


4.3. FINANCIAMENTO DO TRABALHO ASSISTENCIAL

Recebemos doações em dinheiro e em espécie. As doações em espécie são feitas diretamente nas dependências do Centro.

Destino das doações:
1) Quando o material está em bom estado, guarda-se para os Chás Beneficentes;
2) Material mais ou menos bom, guarda-se para um Bazar mensal;
3) Material em estado regular é posto no Bazar diário, sendo que nos dias do atendimento às gestantes, faz-se uma "feirinha", em que as gestantes escolhem os objetos que lhes interessam e levam-nos gratuitamente.
5. AÇÃO SOCIAL ESPÍRITA
5.1. PÚBLICA E PRIVADA
ação social espírita fundamenta-se no voluntariado que, à semelhança da “Casa do Caminho”, procura levar reconforto material e espiritual aos mais necessitados. Nesse mister, diferencia-se do Serviço Social governamental, pois enquanto este visa dar apenas o alimento, aquele procura ver o  indivíduo como um todo, no sentido de fazer-lhe desabrochar os germes de sua evolução espiritual.
5.2 MISSÃO DO ESPIRITISMO
Considerando que a missão precípua do Espiritismo visa à “transformação da humanidade pela melhoria das massas por meio do gradual aperfeiçoamento dos indivíduos”, todo o auxílio feito ao próximo deve ser acionado dentro de um programa que tenha por objetivo o reequilíbrio moral; a reintegração social e a educação espiritual.
Assim, de acordo com os pressupostos codificados por Allan  Kardec, devemos não só dar o alimento que mata a fome, o agasalho que supre o frio, mas também o reconforto espiritual da palavra esclarecedora, que estimula o nosso irmão menos aquinhoado materialmente a caminhar com os próprios pés.
5.3. NÃO CONFUNDIR OS MEIOS COM OS FINS
Um dos grandes erros da humanidade é a confusão entre os meios e os fins. À pergunta, qual é o fim da religião, responderíamos que é para salvar almas, fazer a pessoa evoluir, conhecer melhor a Deus. Dentro desse raciocínio, qual é o fim do Espiritismo? Transformação do indivíduo? Burilamento interior? Mas será que os meios empregados tendem para este fim? 
Tomemos, por exemplo, a doação de cestas básicas. Se, paralelamente a essa dádiva, não estivermos incentivando a pessoa a se melhorar, a se  aperfeiçoar, a  evoluir espiritualmente, estaremos apenas criando dependentes, o que contraria sobremaneira o objetivo do Espiritismo que, segundo o Espírito Emmanuel, é a libertação da consciência.
Resumindo: o alimento é o meio, a libertação da alma é fim. Saibamos distinguir um do outro.
6. SUBSÍDIOS PARA ALICERÇAR A AÇÃO SOCIAL ESPÍRITA
Na literatura espírita há diversos ensinamentos sobre a melhor maneira de praticar a caridade. Eis alguns deles.
1) P. 768 de O Livro dos Espíritos “Nenhum homem dispõe de faculdades completas e é pela união social que eles se completam uns aos outros, para assegurarem seu próprio bem-estar e progredirem. Eis porque, tendo necessidade uns dos outros, são feitos para viver em sociedade e não isolados”. No isolamento o homem se embrutece e se estiola.
2) A Parábola do Bom Samaritano, que bem compreendida, dá-nos o exato conceito do que seja a Caridade ensinada pelo Cristo.
3) P. 886 de O Livro dos Espíritos - Qual o verdadeiro sentido da palavra caridade, como a entendia Jesus? – Benevolência para com todos, indulgência para as imperfeições dos outros, perdão das ofensas. “O amor e a caridade são o complemento da lei de justiça, pois amar o próximo é fazer-lhe todo o bem que nos seja possível e que desejáramos nos fosse feito. Tal o sentido destas palavras de Jesus: Amai-vos uns aos outros como irmãos”.  
4) Fora da Caridade não há Salvação – “Meus filhos, na sentença: Fora da caridade não há salvação, estão encerrados os destinos dos homens, na Terra e no céu; na Terra, porque à sombra desse estandarte eles viverão em paz; no céu, porque os que a houverem praticado acharão graças diante do Senhor”. Essa divisa é o facho celeste, a luminosa coluna que guia o homem no deserto da vida, encaminhando-o para a Terra da Promissão. Ela brilha no céu, como auréola santa, na fronte dos eleitos, e, na Terra, se acha gravada no coração daqueles a quem Jesus dirá: Passai à direita, benditos de meu Pai.  -  Paulo, o apóstolo  -  (Kardec, 1984, Cap. XV, item 10)
5) Na Obra Assistencial “Jamais reter, inutilmente, excessos no guarda-roupa e na despensa, objetos sem uso e reservas financeiras que podem estar em movimento nos serviços assistenciais”.  Não há bens produtivos em regime de estagnação. (Vieira, 1981, p. 53)
7. CONCLUSÃO
A ação social numa Casa Espírita reveste-se de particular importância. Não nos sirvamos dela para criar dependentes, mas para auxiliar cada qual a alcançar a sua libertação, tanto material quanto espiritual.
8. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
KARDEC, A. O Evangelho Segundo o Espiritismo. 39. ed., São Paulo, IDE, 1984.
KARDEC, A. O Livro dos Espíritos. 8. ed., São Paulo, FEESP, 1995.
SILVA, B. (coord.) Dicionário de Ciências Sociais. Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas, 1986.
VIEIRA, Waldo. Conduta Espírita. Pelo Espírito André Luiz. 8. ed., Rio de Janeiro, FEB, 1981.
www.espirito.com.br. Manual de Apoio para as Atividades do Serviço de Assistência e Promoção Social Espírita, da FEB.
São Paulo, outubro de 2002




Fé, Esperança e Caridade

Sérgio Biagi Gregório  
SUMARIO: 1. Introdução. 2. Conceito. 3. Considerações Iniciais. 4. Fé: 4.1. Fé Cega ou Raciocinada, Divina ou Humana4.2. Tópicos sobre a Fé; 4.3. Fé e Incerteza5. Esperança: 5.1. Niilismo; 5.2. Desespero e Presunção; 5.3. Paulo e a Esperança6. Caridade: 6.1. Noção de Caridade; 6.2. Tópicos acerca da caridade; 6.3. Caridade Teórica versus Caridade Prática. 7. Fé, Esperança e Caridade: 7.1. Por que Juntar Fé, Esperança e Caridade? 7.2. Revisando as Noções de Fé, Esperança e Caridade; 7.3. Fé: Mãe da Esperança e da Caridade. 8. Conclusão. 9. Bibliografia Consultada.
1. INTRODUÇÃO
Podemos praticar atos de caridade sem sermos caridosos? Que relação há entre fé, esperança e caridade? Qual dos termos tem mais importância? Por que é aconselhável estudá-los conjuntamente? Com essas perguntas, damos início ao nosso trabalho, que se desenvolverá em cima dos tópicos – fé, esperança e caridade -, no sentido de unificá-los.
2. CONCEITO
 – É atitude própria, convicção ou crença que relaciona o homem ao Deus Supremo na expectativa da salvação da alma.
Esperança – É, genericamente falando, toda a tendência para com o bem futuro e possível, mas incerto.
Caridade – É a virtude que, com a justiça, regula o procedimento moral dos homens para com os outros seres e, especialmente para com os outros homens. Baseia-se na frase: "Fazermos aos outros o que gostaríamos que nos fosse feito".
3. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Para uma compreensão mais ampla do tema, convém buscarmos alguns esclarecimentos acerca da virtude, principalmente no que diz respeito às virtudes morais. As virtudes morais são potências racionais que inclinam o homem para o bem, quer como indivíduo, quer como espécie, quer pessoalmente, quer coletivamente. Há duas ordens de moralidade, a natural e a infusa. Por isso, temos duas espécies de virtudes: adquiridas e infusas. Entre as virtudes adquiridas, distinguem-se principalmente quatro: prudência, justiça, fortaleza e temperança. Cognominadas de cardeais (de cardo, gonzo), por ser em redor delas que giram todas as outras, tais como a paciência, a tolerância, a brandura etc. Entre as virtudes infusas estão a , a esperança e a caridade, cognominadas de teologais, porque não são o produto de uma prática, mas um dom infuso de Deus nos seus filhos.
4. FÉ
4.1. FÉ CEGA OU RACIOCINADA, DIVINA OU HUMANA
A Fé é um sentimento inato no indivíduo. A direção desse sentimento pode ser cego ou raciocinado. A Fé cega, não examinando nada, aceita sem controle o falso como o verdadeiro, e se choca, a cada passo, contra a evidência e a razão; levado ao excesso produz o fanatismo. A Fé raciocinada, a que se apóia sobre os fatos e a lógica, não deixa atrás de si nenhuma obscuridade; crê-se porque se está certo, e não se está certo senão quando se compreendeu; eis porque ela não se dobra; porque não há Fé inabalável senão aquela que pode encarar a razão face a face, em todas as épocas da humanidade (Kardec, 1984, cap. XIX, item 6).
A Fé é humana e divina. É o sentimento inato, no homem, de sua destinação futura, cujo germe foi depositado nele, primeiro em estado latente, o qual deve crescer por sua vontade ativa. Assim, unindo sua força humana à Vontade Divina poderá realizar os "prodígios" e que não é senão o desenvolvimento das faculdades humanas (Kardec, 1984, cap. XIX, item 12).
4.2. TÓPICOS SOBRE A FÉ
Folheando O Evangelho Segundo o Espiritismo, encontraremos diversos temas relacionados com a fé. Entre eles, encontram-se: "A fé que transporta montanhas", "A tua fé te curou", "O poder da fé", "A fé religiosa", "A fé e a caridade" etc. Para cada um desses tópicos, tanto Allan Kardec como os Espíritos superiores, dão-nos informações valiosas. No caso da montanha, por exemplo, sabemos que não é a montanha física, mas os nossos erros, os nossos defeitos. Na cura pela fé, Allan Kardec faz menção do uso do fluido vital (magnetismo), que se encontra em todos os seres humanos e que, se bem manipulado, pode provocar curas, que muitos chamam de "milagres".
4.3. FÉ E INCERTEZA
A dificuldade maior na questão da fé é esperar algo que é incerto. Temos a intuição de que este é o caminho, mas a demora na obtenção do necessário incrusta-nos o desespero. A intuição afirma que devemos perseverar, contudo a espera é difícil. De qualquer forma, temos de continuar, pois desistir no meio do combate, é ficar sem ponto de apoio e sem perspectiva de um futuro mais promissor.
A fé é o nosso grande sustentáculo. Que seria de nossa incerteza, de nossas tribulações sem esse ponto de apoio para sermos reconfortados? Aquele que tem fé vigorosa aceita de bom grado qualquer extremo, pois, embora esteja no meio da incerteza momentânea, espera que o tempo, o grande arquiteto do universo, possa oferecer as oportunidades para que os seus ideais sejam concretizados.
5. ESPERANÇA
5.1. NIILISMO
Na Filosofia Moderna, as injunções dos pensamentos, a busca pela racionalidade e a supremacia da razão levam os indivíduos a decretar a morte de Deus. É a doutrina do nada além desta miserável vida. Esse sistema mata toda a Esperança. Como esperar algo se nada há o que se esperar? É por isso que Paul Sartre falava da náusea e do desespero, antíteses da esperança.
5.2. DESESPERO E PRESUNÇÃO
Santo Tomás de Aquino classifica o desespero e a presunção como pecado, e por isso, o oposto da esperança. O desespero é a pouca confiança em Deus, o amor próprio, o orgulho pessoal. A presunção é achar-se alguém digno de uma posição religiosa vantajosa, sem de fato o ser. Tanto um quanto o outro é contrário ou opõem-se à esperança. Acrescenta ainda que as causas do desespero são os nossos vícios, os quais nos obnubilam. A presunção, por outro lado, está ligada à vaidade. Por fim, diz que a esperança não é uma atitude passiva, mas cheia de vitalidade e de amor. (Lain Entralgo, 1984)
5.3. PAULO E A ESPERANÇA
Nas Epístolas de Paulo encontramos diversas frases sobre a esperança. Eis algumas delas: "Porque tudo que dantes foi escrito, para nosso ensino foi escrito, para que pela paciência e consolação das Escrituras tenhamos esperança". (Romanos, 15, 4); "Ora o Deus de esperança vos encha de todo o gozo e paz em crença, para que abundeis em esperança pela virtude do Espírito Santo". (Romanos, 15, 13); "Tendo por capacete a esperança na salvação". (I Tessalonicenses, 5, 8); "E assim, esperando com paciência, alcançou a promessa." (Hebreus, 6, 15); Em I Coríntios 13, Paulo discorre sobre a suprema excelência da caridade. Depois de tecer comentários sobre a parte e o todo, ele diz: "Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e a caridade, estas três, mas a maior destas é a caridade." (I Coríntios, 13, 13)
6. CARIDADE
6.1. NOÇÃO DE CARIDADE
A noção de caridade está posta na parábola do bom samaritano. (Lucas cap. 10, 25 a 37)
Nela narra-se que "Um homem, que descia de Jerusalém para Jericó, caiu nas mãos de ladrões que o despojaram, cobriram-no de feridas e se foram, deixando-o semimorto. Aconteceu, em seguida, que um sacerdote descia pelo mesmo caminho e tendo-o percebido passou do outro lado. Um levita, que veio também para o mesmo lugar, tendo-o considerado, passou ainda do outro lado. Mas um Samaritano que viajava, chegando ao lugar onde estava esse homem, e tendo-o visto, foi tocado de compaixão por ele. Aproximou-se, pois, dele, derramou óleo e vinho em suas feridas e as enfaixou; e tendo-o colocado sobre seu cavalo, conduziu-o a uma hospedaria e cuidou dele. No dia seguinte, tirou duas moedas e as deu ao hospedeiro, dizendo: Tende bastante cuidado com este homem, e tudo o que despenderdes a mais, eu vos restituirei no meu regresso".
A caridade está simbolizada na ação do samaritano que, embora menos esclarecido que os outros, quanto à lei de Deus, concretiza o auxílio.
6.2. TÓPICOS ACERCA DA CARIDADE
No Evangelho segundo o Espiritismo encontramos diversos assuntos sobre a caridade. Eis alguns deles: "Fora da caridade não há salvação", "Necessidade de caridade segundo Paulo", "Caridade moral e caridade material", "Caridade para com os criminosos", "Fazer o bem sem ostentação", "As práticas da caridade" e "O óbolo da viúva". Nessas e em outras passagens encontramos os subsídios necessários para bem praticarmos a caridade. Elas espelham a orientação dos Espíritos superiores, que sempre pugnam pela verdade das coisas, independentemente do ser humano gostar ou não.
6.3. CARIDADE TEÓRICA VERSUS CARIDADE PRÁTICA
O Espírito Irmão X, no capítulo 28 de Contos e Apólogos, narra o caso do conferencista que estava preparando a sua palestra. Os seus escritos exaltavam o amor ao próximo, dando a entender que o caluniador é um teste de paciência, os vitimados pela ofensa estavam recebendo de Jesus o bendito ensejo de auxiliar, a desesperação é chuva de veneno invisível etc. No meio dessa preparação, a velha criada veio trazer-lhe o chocolate que, sem o perceber, deixara cair uma mosca. O conferencista, tão logo toma consciência fato, fica deveras irritado com a serviçal. Depois, um condutor de caminhão arrojara o veículo sobre um dos muros da residência. O dono da casa foi à rua como que atingido por um raio, chamando o motorista de criminoso. O condutor se prontificou a pagar todas as despesas, mas assim mesmo quis chamar a polícia. Enquanto estava ao telefone, algumas crianças entraram no terreno e pisaram os cravos que tinha cuidado no dia anterior. Exasperado, falou para as crianças: vagabundos, larápios, já para a rua. Voltando para a sua escrivaninha, leu o seguinte texto, grafado por ele mesmo: - "Quando Jesus domina o coração, a vida está em paz". Reconheceu quão fácil é ensinar com as palavras e quão difícil é instruir com os exemplos e, envergonhado, passou a refletir... (Xavier, 1974)
7. FÉ, ESPERANÇA E CARIDADE
7.1. POR QUE JUNTAR FÉ, ESPERANÇA E CARIDADE?
De acordo com a religião, esses tópicos fazem parte das virtudes teologais. Sendo assim, eles estão relacionados, ou seja, um depende do outro para que o ser humano possa se expressar no mundo. A separação didática é apenas para estudar com mais detalhes um dos tópicos. Mas, na prática, não temos condições de os separar, porque estão unidos pelos laços da razão e do sentimento.
7.2. REVISANDO AS NOÇÕES DE FÉ, ESPERANÇA E CARIDADE
 é o assentimento do intelecto que crê, com constância e certeza em alguma coisa. Isso nos dá confiança de que seremos capazes de realizar alguma ação, seja ela qual for. É o tipo de confiança que tem o médico de que irá terminar a sua operação.
esperança – é a expectação de algo superior e perfeito. A esperança diz respeito à nossa transcendência, à nossa comunhão com o Ser supremo. Por que, mesmo nas situações mais difíceis, há sempre a expectativa de possuir o bem desejado? Alguns mesmos chegam a dizer que "a esperança é a última que morre".
Caridade – está mais ligada a uma ação concreta. Ela é presente, é uma prática. Enquanto as duas primeiras dizem respeito ao futuro, esta diz respeito ao presente, à ação. Nesse sentido, podemos diferenciar os atos de caridade da caridade propriamente dita, ou seja, podemos perfeitamente auxiliar o próximo, sem que esse sentimento faça parte de nosso passivo espiritual.
7.3. FÉ: MÃE DA ESPERANÇA E DA CARIDADE
A fé, mãe da esperança e da caridade, é filha do sentimento e da razão. Quer dizer, a fé, ao ser movida pelo livre-arbítrio, tem o suporte do sentimento e da razão, que lhe dão garantia de obter o esperado, desde que aja caritativamente. Nesse sentido, o Espírito Emmanuel diz-nos: "A fé é guardar no coração a certeza iluminada de Deus, com todos os valores da razão tocados pelo perfume do sentimento".
esperança e a caridade, como vimos, são filhas da fé. Esta deve velar pelas filhas que tem. Para isso, convém construir a base do edifício em fundações sólidas. A nossa fé tem de ser mais forte do que os sofismas e as zombarias dos incrédulos, porque a fé que não afronta o ridículo dos homens não é a verdadeira fé. Além disso, para que a fé seja proveitosa, deve ser ativa, ou seja, não se deve entorpecer.
8. CONCLUSÃO
O relacionamento entre fé, esperança e caridade abre a nossa mente para as profundas reflexões sobre a vida religiosa. Essas três virtudes descortinam horizontes vastíssimos. É aconselhável, contudo, que sejamos humildes e simples de coração a fim de absorver todo o seu conteúdo doutrinal.
9. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
KARDEC, A. O Evangelho Segundo o Espiritismo. 39. ed. São Paulo: IDE, 1984.
LAIN ENTRALGO, P. La Espera y la Esperanza: Historia y Teoría del Esperar Humano. 2. ed., Alianza Editorial Madrid, 1984.
XAVIER, F. C. Contos e Apólogos, pelo Espírito Irmão X. 3. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1974.
São Paulo, abril de 2000